quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Contos Inacabados

O Bosque dos Agoniados

por Luz Le Fay





Um


Um vulto de homem cruza as ruas escuras da cidade. As luzes dos postes, fracas, iluminam apenas uma pequena área ao redor, ele foge das luzes, gosta da noite. A noite das criaturas divinas, das manifestações, das gestações. Seus olhos cor de aço brilham quando se volta para abrir a porta do carro. Do outro lado da rua, as árvores em seu balé calmante testemunham tudo, tudo o que não pode ser visto por olhos humanos. Testemunham a volta dele. Ele sorri com satisfação, seus lábios bonitos se abrem para dentes perfeitos e ele entra no carro e dá a partida.
Minutos depois Paulo desce de um táxi. Os olhos fixos na fumaça do cigarro, paga o motorista, distraído, e entra pelo portãozinho de ferro que emite um lamento, rangendo. Já se dirigia ao seu destino – o laboratório de imagem e som da universidade – quando ouve um choro vindo da pequena praça das árvores. Volta-se, procura ouvir novamente. Silêncio. Pensa que foi impressão, aquelas árvores rangem e assoviam sob a força do vento... Deve ter sido isso. Deu um passo e novamente ouviu o choro. De mulher. Triste, um lamento. Seus pelos se arrepiaram quando perscrutando a noite com o olhar não vê nenhuma mulher ali. Estava assim concentrado quando uma luz no segundo andar o trouxe à realidade. A luz caiu sobre alguns espaços da praça e ele ficou pasmo com o que viu.

Havia sim uma mulher no bosque. Cuja a obscuridade havia protegido do seu olhar. Mas agora sob a luz ele pode ver o perfil delicado voltado para as mãos que torcia sobre o colo. Parecia bela e jovem. Paulo coçou a nuca, como sempre fazia ao pensar, e se balançou nas pernas. Não parece uma das alunas da noite e já está bem tarde todos já devem ter ido. Olhou o relógio, quase 23 horas. A figura recortada pela luz permanecia imóvel, sentada num dos bancos sob as árvores. Depois de muito ponderar, Paulo resolve se aproximar da mulher. Segue pelo caminhozinho de pedras miúdas, os sapatos chiando e parecendo fazer o barulho mais alto do mundo. Ao notar sua aproximação a moça enxuga os olhos e fita o homem que pára a sua frente.
- Você está bem? – pergunta Paulo e emenda – há algum problema?
A moça levanta-se do banco assustada.
- Tudo bem... – enxuga os olhos com o dorso da mão. – já está tarde...
- É... – diz Paulo, analisando a moça sem perceber. – A essa hora todos já estão indo embora, é perigoso você ficar aqui.
- Eu sei... É perigoso para você também. – a moça lança um olhar que Paulo considera no mínimo estranho.
- Você está realmente bem, desculpe, é que vi você chorando... – arrisca ele.
- É verdade. Choro pelo meu destino. – a moça fez menção de ir embora, mas Paulo não pode conter a curiosidade e disparou:
- Que destino?
Aí a moça fez uma coisa que pareceu a ele, Paulo, um professor de “tecnologia da informática”, a coisa mais estranha, mais insólita que ele já vira: ela apontou para uma das árvores retorcidas da praça e quando ele virou-se para pedir uma explicação, a moça havia desaparecido.




CONTINUA

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